domingo, maio 31, 2009

Narcisismo


  • **O Mito de Narciso

    De acordo com a mitologia grega, Narciso era um belo jovem Tespiano pelo o qual Eco se apaixonou. Ela foi privada da fala por Hera, a esposa de Zeus e só podia repetir as últimas sílabas das palavras que ela ouvia. Incapaz de expressar seu amor por Narciso, ela foi rejeitada por ele e morreu com o coração partido. Os deuses então puniram Narciso por seu tratamento duro com Eco e o sentenciaram a apaixonar-se por sua própria imagem. Foi previsto pelo vidente Tirésias que Narciso viveria até que ele olhasse para si mesmo. Um dia quando ele estava próximo às águas límpidas de uma fonte, Narciso teve a visão de seu reflexo na fonte, ele viu o seu reflexo na água. Ele se apaixonou perdidamente por sua imagem e se recusou a abandonar o local. Ele morreu ali e se transformou em uma flor – o Narciso que cresce nas margens das nascentes de água.


É significativo que Narciso tenha se apaixonado por sua imagem logo depois dele ter rejeitado o amor de Eco. Apaixonar-se por sua imagem – isto é se tornar narcisista – é visto no mito como uma forma de punição de ser incapaz de amar. Mas se levarmos a lenda um pouco mais longe. Quem é Eco? Ela poderia ser nossa própria voz retornando para nós mesmos. Portanto, se Narciso pudesse dizer “Eu te Amo”, Eco repetiria estas palavras e Narciso se sentiria amado. A incapacidade de dizer estas palavras identifica um narcisista. Tendo retirado sua libido das pessoas do mundo, narcisista são condenados a se apaixonarem por sua própria imagem. (2)

Ao rejeitar Eco, Narciso rejeitou sua própria voz (ou o eco dela). A voz (ou seu eco) é a expressão do seu ser interno. A voz se vem de dentro é a própria manifestação da voz interna do ser. À medida que Narciso não a ouve é a rejeição de sua voz interior trocada pela obsessão por sua imagem.

Sobre a profecia de Tirésio que Narciso poderia morrer se visse sua imagem, na verdade aqui considero, que se Narciso encontrasse com sua própria verdade ele se encantaria com ela e morreria como ego. Sua beleza excepcional o encantaria de tal forma que poderia se tornar ou uma maldição ou uma benção. Esta dicotomia é real, tendo em vista, o mistério que a vida nos apresenta, somos a própria expressão da essência divina. Mas à medida que nos encantamos com nossa imagem externa, uma esquizofrenia se estabelece. E isto se constrói a partir da mais tenra idade quando fomos condicionados. O ego em formação é a sombra mentirosa que nos foi imposta desde cedo, ela nos assombra por toda a vida.

As interpretações desta estória podem ser diferentes mas no contexto que eu gostaria de apresentar aqui é a relação do ‘EU’ e do ‘OUTRO’. Á medida que nossa natureza nos presenteia com a possibilidade de nos conhecermos e de nos permitir a um auto- erotismo, a psicologia narcisista pode estar presente.

Martin Buber fala da relação do ‘EU’, do ‘OUTRO’ e do ‘TODO’ referindo-se à nossa relação com o aquilo. Mas se existe um “EU” e um “OUTRO”, separados como pode haver relações com um “TODO” Eu aqui e o Todo lá... na verdade se não existe um “EU” só existe um “TODO” ou “Aquilo”. “EU” sou o “TODO”.

EU SOU O TODO

1
“Eu e o Outro” – na estrada
Não é uma amorosa relação
Assim você tem uma alma separada
É sobre oração e adoração
2
Para os Upanishads não pode ser
Não existe um “EU” -- um “OUTRO” não há
Você é o “TODO”! Você pode ver?
O Todo! Onde quer que você vá
3
Não há relacionar em “EU e o Todo”, na realidade
Se o “EU” cai, o “Todo” aparece
Os Upanishads chamam de “TAT” a suprema verdade
Sat Chid Ananda é a raiz de onde ela cresce
4
Sat é a existência como ela é
Chid é a consciência desta realidade
Ananda o supremo êxtase é
Estas são as três qualidades
5
Quando sat chid anand é realizado
Alcança-se “Aquela” realidade
“Eu existo”, vá profundamente guiado
É a primeira cônscia qualidade
6
Eu existo, eterno – nunca mudando
E você está imediatamente consciente
Também o êxtase vai se moldando
Saia totalmente da sua mente
7
Realize, mova-se para a consciência
Se você consegue, fique alerta, eu sei bem
Você perceberá a sua própria essência
Que você existe em êxtase também
8
Ou seja extático em seu caminhar
A miséria você não deve permitir
Resista cair nela, Eu posso afirmar
Além do céu e do inferno você vai existir
9
Os três caminhos do divino
Os atributos da suprema realidade
Sat Chid Ananda um brilho fino
Eu sou aquela absoluta eternidade

Agora só meditação poderá seguir...

Canções de Goloka
Referência: Osho, That Art Thou…


Como vimos anteriormente, a fase autosexual é naturalmente narcisista é a fase da auto descoberta e do amor pelo corpo e por sua energia. Mas à medida que é criada uma divisão entre o que a criança sente por sua própria natureza e o que os seus pais a condicionam a condenar, por causa de uma moral estabelecida de geração a geração, surge a patologia do narcisismo com suas variantes: caráter narcisismo fálico, caráter narcisista, personalidade borderline e personalidade paranóica. A divisão entre o SER essencial natural e o EGO construído artificial.


O Ser e o Ego
1.
Eu não sou só os meus sentidos, vou além.
Eu não nasci só como um corpo aparente.
Eu não sou só um intelecto também
Nem a mente, nem um ego permanente.
2.
Eu sou para sempre a pura natureza
Sem a mente e a respiração vital
Sem intelecto eu sou a testemunha com certeza
Sou a sempre sábia pura consciência original
3.
Há uma longa viagem do “Eu” que faz,O
“Eu” do ego, do acúmulo, do obter.
Para o “Eu” que é, o segundo “Eu” da paz.
“Quem sou eu?” Este segundo “Eu” do ser?
4.
Aquele que está lá “a priori” é o ser.
Não é aquele que você criou, que você fez.
Você é isto, ele é o seu amanhecer.
Não tem nada a ver com sua tez
5.
A criança nasce com um centro
Sem circunferência, sem periferia.
O fazer vai crescer, cultivar o fora, não o dentro.
O ego seja superior ou inferior é a anomalia
6.
O ego é a identificação com o que foi feito
Se você é um sucesso ou um fracasso, não importa,
É a afirmação “Eu sou isto”, “Eu sou aquilo”, deste jeito.
Se este sentimento cresce, a essência é morta.
7.
O ego é o superficial criado por nós, nosso fazer.
O ser é o que nós somos, puras consciências.
O “Eu” interno só por eliminação vai Ser
Via negativa, “Neti Neti” cortar todas as aparências
8.
O ser é aquele que nunca nasceu
Tudo que nasce não é o ser
Antes de nascer o ser sou “Eu”
Este é o meu atma, o meu conhecer.
9.
Mesmo sem os sentidos, a respiração.
Sem o pensamento o ser está lá presente
O estado de ser original, a realização.
Tudo é em sua pureza e potencialidade permanente
10.
Este centro mais interno é consciente
A natureza verdadeira desta permanência
Não é cônscia sobre algo à sua frente
É um espelho refletindo nada: É a pura consciência.
11.
E isto não é só uma mental projeção
Não é filosofia – amor ao pensamento
É “darshan”, filosia – amor à visão.
Neste realizar o ser tem seu alento.
12.
Pensar é só pensar, não é ver a verdade.
O pensamento precisa cessar para haver clareza
A não ser que você saiba, não aceite a novidade.
Explore até que a dúvida cesse com certeza
13.
Não crie nenhuma falsa crença
Melhor duvidar com sinceridade
Seja autêntico, original e aí vença.
Um momento vem, a dúvida se vai e vem a liberdade.
14.
Aquilo que os Upanishads vêem dizendo:
Sem nenhuma dúvida você agora sabe
A consciência pura você vai compreendendo
Isto é assim, só assim é que cabe.

Canção de Goloka

O auto-erotismo pela masturbação é uma forma de expressão que se caracteriza por se dar prazer, legítima em si mesmo, se a pessoa está conectada com seu SER sendo o corpo o seu templo e aceitando a forma de manifestação da energia natural; não pode ser considerado como um narcisismo patológico. No entanto o hábito de se masturbar após uma certa idade denota uma continuada necessidade de se estar ainda na fase autosexual que foi reprimida. O auto-erotismo na fase autosexual é absolutamente natural e tem seu tempo de maturação se for deixado fluir, mas à medida que há repressão, a energia precisa se expressar; a pessoa continua nesta fase até idade adulta não amadurecendo sexualmente, desenvolvendo patologias, como o narcisismo, a esquizofrenia, etc...

O mesmo ocorre na fase homossexual, por causa da repressão e condenação ela se estende até mesmo por toda a vida, o narcisismo pode se manifestar muito intenso nesta fase que em vez de uma prática auto-erótica, a pessoa substitui por se buscar sua satisfação com o mesmo sexo, ambos os parceiros dando vazão ao seu narcisismo intensificado com a adoração da própria imagem refletida no outro. A pessoa então assume esta personalidade e se engaja em movimentos sociais de defesa do grupo de quem tem a mesma condição, por causa da condenação que se estabeleceu no meio social. A própria sociedade (pais, políticos, padres, pastores, bispos, papas, educadores, legisladores) cria a condição homossexual e depois a condena. Hoje o movimento de pessoas que tem este comportamento é grande em todo mundo e com isso tem conquistado espaços cada vez mais significativos na sociedade doente. Isso é de se esperar.

Nesta nossa análise, o que queremos desenvolver é o aspecto sexual em uma dinâmica de evolução espiritual. O sexo é sem dúvida a raiz disso tudo e como mapeá-lo no sentido de que ele possa ser canalizado naturalmente para a realização espiritual do Samadhi.

A fase heterossexual tem seus próprios condicionamentos. A começar pela instituição do casamento. Os encontros heterossexuais são envolvidos por condicionamentos sociais tremendos. O ato sexual é carregado de crenças absurdas e de busca por resultados de prazer mental (social). Porque o sexo foi reprimido na infância, as relações heterossexuais não podem ser plenas, a não ser que as pessoas sejam maduras. A idéia de casamento é uma fantasia social. Como pode um contrato garantir a plenitude sexual e como consequência a realização do amor e do samadhi?

Mesmo sendo o sexo prevalente, de fato são raras as pessoas que descobriram maneiras de tirar satisfação plena ou um coração amoroso de sua prática. Pesquisas modernas sobre o fenômeno do orgasmo revelaram que uma pessoa ‘normalmente mediana’, sexualmente ativa, tem a experiência do êxtase do orgasmo por vinte segundos em uma semana, noventa segundos em um mês, portanto, dezoito minutos ao ano. E isso é baseado em um orgasmo que dure apenas dez segundos. Até mesmo dez segundos parece ser uma tremenda vitória! Portanto, em cinquenta anos de atividade sexual as pessoas têm o privilégio de terem o êxtase do orgasmo por umas quinze horas no total. Isto tudo é surpreendente (e decepcionante) considerando quantas vezes você ‘transa’ e quanto tempo extra é gasto sonhando e se agonizando em relação ao sexo.

É óbvio que o amor e o sexo não está em um estado satisfatório para a maioria de nós. O sexo não é a força orgástica inocente pura e espiritual que ele deveria ser, transportando-nos para uma dimensão de amor verdadeiro e romance. Ele não nos preenche profundamente, dando-nos a força de encarar cada dia com entusiasmo e não mais nos leva além das pressões ou limitações da nossa vida cotidiana. São muito comuns os problemas sexuais entre homens e mulheres, tal como abusos sexuais, frigidez, ambivalência, ejaculação precoce, impotência e desinteresse sexual. (3)

Não se pode conter a energia sexual; ela é a força da própria vida. Não existem diferentes formas de energia mas uma só. É a maior emoção que nós temos porque ela simplesmente move. Ela se expressa no sexo pois é base de nossa reprodução, de nossa sobrevivência, mas se manifesta nos esportes, nas artes, na ciência, etc. mesmo que tentemos, não podemos reprimir ou ignorar esta energia, podemos apenas aprender a canalizá-la de maneira mais inteligente e madura.

A fase não sexual é a mais madura de todas, quando o indivíduo se volta pra si mesmo sem precisar mais de um parceiro de fora. Mas esta fase tem sido também incompreendida pelas assim chamadas religiões que forçam um celibato, como consequência trazendo muitos tipos de perversão. Na realidade o celibato forçado, ensinado por padres, pudicos, moralistas, bispos, pastores é a causa de quase todas as perversões que presenciamos hoje, inclusive as doenças venéreas e a AIDS, vai aí uma série de considerações e investigações mais profundas. O celibato não natural trouxe o surgimento de aberrações enormes da natureza humana. Haja visto, no mundo ocidental, a larga quantidade de clérigos católicos que se tornam pedófilos, cruéis, pervertidos, em uma escalada sem fim, sendo eles os maiores moralistas a pregar uma vida sem sexo, como se fora uma distração do caminho de Deus. Esta mesma igreja obriga o celibato de seus clérigos, que se transformam em monstros impiedosos.

O que caracteriza o narcisismo é uma supressão versus uma negação dos sentimentos. O outro é um mero objeto de prazer e a pessoa não envolve nenhum sentimento. Perde totalmente a humanidade. Desde a fase autosexual em diante o aspecto narcisista está presente em relacionar o sexo como algo separado do ser, seu corpo ou o corpo do outro são apenas objetos de prazer e não devem provocar nenhum sentimento. Por causa desta patologia observamos todos os tipos de perversão, como: automutilação, fixação homossexual, pornografia, sodomia, sado-masoquismo, prostituição, celibato forçado, pedofilia, estupro, crimes sexuais, vícios sexuais de todos os tipos, etc...
O narcisismo em seus vários graus representa o que eu chamo de ‘sexo mental perverso’ e se encontra em todas as fases do nosso desenvolvimento.

(3) Diana Richardson, Tantric Sex – A Unique Guide to Love and Sexual Fulfillment, New Age Books, ISBN: 81-7822-188-8, ©1999

Um comentário:

ॐ Padma Surya ॐ disse...

G...

Neste ponto já me percebo de forma integrada no entanto sim, não posso aqui negar que o período narcisista já esteve incorporado a mim, insatisfeita com minha busca externa sempre imersas em relações infundadas e incoerentes. Me fechei até certo ponto em mim mesma. Achei que sozinha poderia me satisfazer, que se no caminho encontrasse alguém exatamente igual a mim eu me jogaria e se a pessoa fosse diferente nem perderia tempo tentando. E nesse jogo a vida se destruiu, se tornou uma obsessão e o que era presença total, se revelou uma ausência do presente. Eu estava em qualquer lugar menos aqui e agora.

O amor era uma expressão futurista, pensava sempre que o conhecimento e a racionalização seriam meus melhores amigos, mas me deixar levar pelo sentimento do amor, era fraqueza, afinal não teria ninguém além de mim mesma para compartilhar isso. Então a cada dia, a doença interior, e a falta de algo maior na minha vida, de um sentido, excluia qualquer possibilidade de continuar a fluir com a "vida".

Foi exatamente nesta fase, que o Tantra apareceu. No começo achava maluquice, brigava comigo mesmo. Dizia-me em que buraco estou me metendo? Mas bastou um pouquinho de confinça e entrega para sentir que a vida começava pela primeira vez, a fluir em mim.

Sinto que a fase do Narcisismo se foi completamente. No entanto é necessário, compreendo isso, continuar mergulhando na essência do Tantra, uma possibilidade interna que garante todo o vigor e melodia externa. Estou aos poucos me conhecendo, me encontrando e compartilhando o amor que vibra em êxtase contínuo.


Meus parabéns,
Padma Surya